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A frase "O Brasil não é um país sério" teria sido dita pelo ex-presidente francês Charles De Gaulle, no episódio que ficou conhecido como "Guerra da Lagosta". Segundo ele, a imprensa brasileira, na época, teria feito, ao contrário da imprensa francesa, uma cobertura sensacionalista do sequestro pela Marinha brasileira de navios franceses que estavam pescando lagostas muito próximos à costa brasileira. Diante do que considerou críticas injustas a ele e a França, proferiu a célebre frase "Le Brésil n'est pas un pays sérieux".
Mesmo que estivesse se referindo à imprensa brasileira daquela época, a frase do general De Gaulle, ao generalizar, foi infeliz. Feriu o brio dos brasileiros, como se costumava dizer antigamente. Mas patriotismos à parte, é preciso reconhecer, hoje, que o comportamento de nossas autoridades e a cobertura de certos órgãos de imprensa têm alguma analogia com o caso que tanto irritou De Gaulle. Veja o caso dos dois navios iranianos parados há quase dois meses no porto de Paranaguá, por recusa de abastecimento de combustível por parte da Petrobrás (só abastecidos após decisão judicial).
A decisão da Petrobrás e a justificativa do presidente da República foram um exemplo vivo do mais puro nonsense e causaram sérios danos à diplomacia e à economia do País. À diplomacia, porque Bolsonaro simplesmente declarou que o Brasil estava "alinhado com a política deles (dos EUA) e fazemos o que tem que fazer". Nunca a nossa diplomacia foi tão menosprezada, nem uma autoridade (ainda mais um presidente) tinha se rebaixado tanto perante os EUA. Aliás, Bolsonaro parece acreditar que as relações exteriores são mesmo um assunto de família, já que pretende nomear o próprio filho como embaixador em Washington.
No caso da economia, o absurdo foi maior ainda. Os navios iranianos trouxeram ureia para o Brasil e já estavam contratados por empresas brasileiras, na volta ao Irã, para transportarem 110 mil toneladas de milho, avaliadas em R$ 100 milhões. A retenção dos navios no porto, além do óbvio prejuízo para os nossos produtores de milho, arranhou as relações diplomáticas e comerciais com o Irã, um dos nossos maiores parceiros comerciais. O Irã é simplesmente o maior comprador de milho brasileiro: em 2018, o Brasil exportou 6,37 milhões de toneladas para esse país, o equivalente a quase 30% das exportações do cereal, no valor de mais de 1 bilhão de dólares. Agora, imagine o prejuízo se o Irã rompe as relações comerciais com o Brasil! O medo do presidente de causar qualquer "rusga" com os Estados Unidos, segundo suas próprias palavras, teria sido um verdadeiro "tiro no pé".
Os exemplos de adeus à diplomacia não param por aí. Recente portaria do ministro da Justiça e Segurança (Sérgio Moro) estabelece um rito sumário de deportação de estrangeiros considerados "perigosos" ou que tenham praticado "ato contrário aos princípios e objetivos dispostos na Constituição Federal". O estrangeiro considerado culpado deverá deixar o país no prazo de 48 horas. Bolsonaro ironizou, de forma preconceituosa, o fato do jornalista Glenn Greenwald (jornalista do site The Intercept, que tem divulgado diálogos de Moro e procuradores), que é estrangeiro e homossexual, não se encaixar na referida portaria. Senão seria deportado sumariamente. Apenas para registro: o ministro Moro tem defendido publicamente que as mensagens publicadas pelo site sejam simplesmente apagadas. Isso, definitivamente, não parece ser sério, diria o general De Gaulle!